Por Carolina Vaz
Foto de capa: Raysa Castro

A saúde mental é um tema considerado muito delicado para quem mora em territórios marginalizados, seja pelo adoecimento causado pela insegurança alimentar e financeira, seja pela constante presença da violência armada. Este é o caso do Conjunto de Favelas da Maré, um dos maiores conjuntos de favelas do Rio de Janeiro, com cerca de 140 mil moradores que, em 2024, sofreram com mais de 40 operações policiais. Parte deste problema poderá ser agora amenizado com a chegada na Maré do movimento Psicólogos sem Fronteiras (PSF), que reúne profissionais da área para realizar atendimentos de tipos variados, gratuitamente, e isso se realizará em parceria com o Centro de Estudos e Ações Solidárias da Maré (CEASM).
As demandas do território
Após algumas reuniões online nas quais os membros do PSF puderam conhecer representantes do CEASM e vice-versa, cada lado expondo suas características, serviços e demandas, uma visita presencial foi realizada no dia 13 de janeiro. Recebemos o coordenador-geral do movimento, Roder Goes; o consultor Fernando Mesquita; e também Felipe Cruz, facilitador do PSF para o Rio de Janeiro. Eles fizeram uma visita guiada no Museu da Maré, onde puderam conhecer a história do território através da exposição de longa duração Os Tempos da Maré, e depois seguiram para o CEASM. Na nossa sede, reuniram-se com o diretor Luiz Antonio de Oliveira, a coordenadora do Jornal O Cidadão Carolina Vaz e os membros da coordenação do Preparatório JB Henrique e Thais Felicidade. Nesse encontro, a equipe do PSF pôde ter mais conhecimento das demandas de saúde mental dos beneficiários da instituição, principalmente alunos do Preparatório.



Segundo o coordenador geral do Psicólogos sem Fronteiras, Roder Nagib Goes, a organização vem tentando expandir sua atuação em prol de democratizar o acesso à saúde mental. Hoje, o PSF já se encontra no Maranhão, Distrito Federal, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Ao visitar a Maré e conversar com os representantes do CEASM, ele pôde se deparar com demandas antes não identificadas para a área da psicologia, principalmente na psicologia escolar. "A minha percepção é que eu preciso trabalhar com muitas variáveis que eu não estava considerando, porque não é só aprender, tem que pensar nas condições para se aprender, e as condições daqui são muito particulares, envolvem questões muito sensíveis como violência, exposição a violência, e violência de diversas ordens", afirmou Roder Nagib. Ele contou, ainda, que ter conhecido uma instituição que aborda o tema com tanta atenção gerou mais confiança sobre a parceria: "Perceber que tem um projeto aqui com essa dimensão, com esse carinho, com esse cuidado, cresceu os olhos e nos deixou um pouco mais esperançosos".

Quem estabeleceu esse primeiro ponto de contato foi Felipe Cruz, mareense da Baixa do Sapateiro, atualmente morando em Campinas (SP), e professor de Geografia especializado em Educação Inclusiva. Em contato com uma amiga da Educação Inclusiva próxima do PSF, descobriu que o movimento tinha planos de atuar na Maré, e na missão de indicar uma instituição de confiança, indicou o CEASM. Felipe foi aluno do pré-vestibular CPV-CEASM e compôs a primeira turma de Jovem Aprendiz da instituição em 2006, além de ser sobrinho de uma das fundadoras da instituição, Rosângela Silva.

Segundo Felipe, os fatores que mais o sensibilizaram em relação à saúde mental no território foram a pandemia de Covid-19 e os frequentes confrontos armados que acontecem: "Quando tem operação policial na comunidade, em especial na Maré, que são operações completamente violentas, que ferem direitos humanos, direitos fundamentais, isso é muito sério. Você pensa naquelas crianças que ficam condicionadas e jogadas no chão quando tem uma operação policial, as famílias que são devastadas pela bala perdida...". Assim, ele se viu motivado a colaborar para que o serviço gratuito e de qualidade do PSF chegasse na Maré.
Próximos passos
O Plano de Trabalho do PSF para atender moradores da Maré em parceria com o CEASM ainda está sendo elaborado. Alguns dos principais objetivos do movimento são: reduzir os sintomas de transtornos mentais como ansiedade e depressão; promover habilidades socioemocionais como empatia e regulação emocional; e fortalecer os vínculos comunitários por meio de campanhas de conscientização e oficinas temáticas no território. Com o tempo, acredita-se que se terá conseguido construir espaços seguros para o diálogo e acolhimento de traumas. A equipe também estará capacitada para o eventual encaminhamento de emergências psiquiátricas para Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), unidades básicas de saúde e hospitais especializados. Mais informações serão divulgadas em breve nas redes sociais do CEASM.
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